Festas universitárias rendem pequena fortuna

Investimento total das empresas terceirizadas pode chegar a R$200 mil em um único evento

Zero
5 min readMay 11, 2015

Se antes as festas universitárias começavam como uma pequena confraternização entre alunos de um curso, hoje elas são programadas com um poder de mercado muito grande. A realidade de poucos eventos ficou pra trás e o entretenimento com festas na UFSC se transformou em um negócio com maior abrangência e valores exorbitantes de investimento e lucro. Os números de festas e de estudantes assíduos só tem aumentado desde o crescimento desse mercado, mesmo com a inflação do preço das festas. Semestralmente, os estudantes universitários são bombardeados com atrações de todos os gêneros e bebidas para todos os gostos.

Desde a proibição de festas no campus David Ferreira Lima em 2011, o mercado de entretenimento estudantil decolou. Hoje, o primeiro semestre de 2015 possui 14 festas programadas — praticamente uma em cada semana — disputando o dinheiro no bolso dos estudantes. Apenas em maio deste ano, cinco festas organizadas por cursos da UFSC marcarão presença no calendário dos alunos. Se um estudante for em todas elas, comprando o segundo lote do ingresso, o preço médio a ser pago chega a R$ 190 para o homem. Se uma universitária resolver aproveitar, esse preço é de R$ 145. Isso sem contar o valor do transporte para os locais, que custam em média R$ 5 por trajeto e adicionariam mais R$ 50 na conta total dos alunos.

Apesar de serem festas de cursos da UFSC para seus estudantes, nem sempre são eles os responsáveis por 100% da organização e do lucro. A parceria entre a empresa PH Eventos e os cursos da UFSC surgiu em 2013 na festa “Pato Loko”, da Odontologia. Dois anos depois, seis das 15 festas do semestre contam com a participação da PHE — a própria Pato Loko, Internação (Relações Internacionais), Injeção Eletrônica (Odontologia e Engenharia Elétrica), Tarja Preta (Farmácia), Peqado (Engenharia Química e de Alimentos) e Apocalipse (Administração, Fonoaudiologia e Química) “Querendo ou não, a gente deu um pouquinho mais de carinho e atenção para esse núcleo”, explica Phillippe Duarte, sócio-diretor da PHE. Ele salientou ainda que nos polos universitários em que essas festas são mais comuns — interior de São Paulo, Paraná e Minas Gerais — sempre existem empresas participando da organização.

Fila para comprar o ingresso da Tourada Mecânica vai do CETEC à reitoria da UFSC

Mas, além das festas universitárias organizadas por agências como a PHE, há também as festas que optam por manter a comissão organizadora composta exclusivamente por alunos do curso, como a Insanitária (Engenharia Sanitária e Ambiental), Tourada Mecânica (Engenharia Mecânica), Betonada da Civil (Engenharia Civil) e o Trote Integrado do CTC, cerimônia de recepção aos calouros dos cursos do Centro Tecnológico.

Contrariando a lógica dos eventos organizados por empresas, o Trote Integrado do CTC continua sendo feito na UFSC semestralmente em frente à reitoria. O Trote Integrado é dividido em duas partes: nas primeiras três horas são feitas as gincanas e brincadeiras com os calouros dos cursos do CTC, e, na segunda parte, a festa com bandas e open bar de cerveja. Além do dia da festa e das gincanas, o Trote Integrado promove ações sociais entre os estudantes, como doação de sangue, alimentos e roupas.

Entretanto, o Trote Integrado do CTC não representa a realidade das festas universitárias. Após a proibição das festas na UFSC em 2011, os eventos se abrigaram em locais privados e afastados da universidade. De 2 mil a 5 mil pessoas, as festas atingem um número maior de estudantes do que os tradicionais — e ilegais — happy hours realizados dentro do campus. “Eu acho certo essa proibição a partir do ponto de que muitas vezes os estudantes não cumpriam com requisitos básicos de segurança e da parte legal de organizar o evento. Não é só tu chegar e botar uma térmica com cerveja e vender. E aí já rolou diversas mortes na UFSC, assaltos, roubos escancarados. Isso tudo é o reflexo de um evento universitário clandestino, entendeu? Por isso eu acredito que nessa proibição só tem coisa boa”, afirma Philippe Duarte.

Mas, claro, elitizar as festas da UFSC tem um preço: levando em consideração a conta feita no começo dessa matéria, um estudante homem da UFSC pode chegar a gastar, em um único mês, metade do valor de uma bolsa-estágio oferecida pela universidade, apenas em festas universitárias. Há alguns anos, quando a maioria das novas festas foi criada, o preço inicial do ingresso era, em média, Dez reais mais barato. Desde então, não somente o preço das festas aumentou, mas também o do transporte e o dos copos personalizados do evento vendidos aos clientes. Mas a inflação dos preços não está relacionada apenas com a lucratividade das festas, segundo Duarte. “É impossível, é completamente inviável hoje a gente manter um evento universitário da forma que a gente oferece pros clientes com ingresso a R$ 25, R$ 30 reais. Se fosse lote único, impossível. Hoje tu sai pra almoçar num restaurante tu gasta 20, 25 reais. Como tu quer ouvir música de qualidade, beber à vontade durante a festa inteira e se divertir com segurança dentro de todas as legalidades sem gastar?”.

É inegável que o número de frequentadores às festas cresceu: na primeira edição da Injeção Eletrônica, em abril de 2014, a festa registrou 2.600 pessoas. No segundo semestre, foram 4 mil. Na última edição da Tarja Preta, o público total chegou a quase 5 mil pessoas. Números altos que indicam que os valores de investimento e lucro são mais altos ainda.

O custo varia e muitas vezes o investimento inicial é da empresa: pode ir de R$ 2 mil a R$ 40 mil, como é o caso da Injeção Eletrônica. Tem evento que custa mais de 200 mil reais e muitas contas são pagas com as vendas de ingresso. Já o lucro depende do acordo entre o curso e as empresas. A porcentagem de lucro do curso pode variar entre 25% e 75% do dinheiro arrecadado.

No caso das festas organizadas exclusivamente pelos alunos, a responsabilidade financeira é exclusivamente deles. Segundo Thiago Ferreira da Silva, aluno da Engenharia Sanitária e Ambiental que já participou diversas vezes da organização da Insanitária, este é o grande ponto para não optar por participação terceirizada. Para ele, o aprendizado e a experiência adquirida pelos estudantes no processo de organização é fundamental para o crescimento pessoal dos envolvidos. Além disso, Thiago exalta o ganho integral do lucro da festa para o curso: “Um dos principais pontos positivos de organizar uma festa sem a presença de uma empresa por trás é que, além do aprendizado que você adquire, o retorno financeiro é todo voltado pro curso. E esse retorno financeiro vai ajudar na formação acadêmica dos estudantes com atividades extracurriculares, na formação de campeonatos, semanas acadêmicas, tudo isso.”

O estudante ainda acredita que a febre de festas não vai durar muito tempo. Com tantos eventos, o público torna-se mais seletivo e exigente. “Quanto tempo você acha que vão durar essas festas da UFSC? Antes era diferente. Hoje o cara não vai em 19 festas, vai escolher as festas que quer ir. E com isso vai reduzir o número de festas, porque elas vão acabar dando mais prejuizo”.

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Written by Zero

Jornal-laboratório do curso de Jornalismo da UFSC

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