Aprendizado: esse é o segundo dos dois encontros promovidos pela escola Era Conectada, para ensinar os idosos a utilizarem o WhatsApp. Para se “matricular”, cada aluno levou dois quilos de alimento que foram doados para o Asilo Irmão Joaquim, no Centro de Florianópolis. Foto de Lívia Tokasiki

Inclusão digital eleva autoestima dos idosos

Iniciativas em Florianópolis ensinam a utilizar WhatsApp e outras ferramentas virtuais

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Texto por Eliza Della Barba e Maria Gabriella Schwaemmle

Darcy da Silva é revendedor de perfumes há mais de 10 anos. Começou de porta em porta, depois os clientes passaram a fazer encomendas por telefone, e agora pedem para ver os produtos através de fotos no WhatsApp. A questão é que o senhor de 79 anos não sabe usar o aplicativo de conversas instantâneas. Com medo de perder clientes e o seu sustento, Seu Darcy, como é mais conhecido, decidiu buscar ajuda para aprender a usar os novos recursos de comunicação digital.

A história se repete com outras pessoas na mesma faixa etária, seja para entrar em contato com familiares que moram longe ou simplesmente para se manter incluído no mundo da tecnologia. Segundo dados da consultoria SeniorLab, até agosto de 2017, passava de 7 milhões o público brasileiro com 60 anos ou mais que utilizava a rede social Facebook. Além disso, o grupo que mais cresce na Internet é o dos idosos. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mostra que houve um crescimento de 25,9% de 2016 para 2017.

Foi pensando nesse público que Luciano e Cristiano Pereira começaram o projeto “Melhor Idade Conectada”, há quatro anos. Os irmãos são proprietários de uma escola de informática e tecnologia no centro de Florianópolis e, percebendo a demanda, passaram a oferecer cursos de como usar computador e smartphone “para aqueles que já sabem muito, mas tem muito a aprender”. Eles já receberam em média 500 alunos, com idade entre 50 e 89 anos.

A principal queixa dos idosos que procuram os cursos é a falta de paciência da família para ensiná-los. “O filho chega, dá um smartphone na mão do pai, da mãe ou do avô e não ensina. A gente até brinca ‘tá me dando uma Ferrari, mas me dá a gasolina, né’”, conta Luciano. Ele percebeu uma grande diferença na autoestima de seus alunos, que saem das aulas mais confiantes e com um brilho nos olhos por ter aprendido algo novo.

De acordo com o estudo desenvolvido na Universidade de Berna, na Suíça, e publicado em 2018, a autoestima cresce e se estabiliza dos 4 aos 70 anos, quando a mesma começa a declinar. Segundo os pesquisadores, esse declínio acontece por conta de perdas familiares e do próprio status social. O fato dos idosos de hoje conseguirem realizar tarefas, como pedir carona em um aplicativo ou fazer compras e pagamentos pela Internet, gera não apenas qualidade de vida, mas também autonomia.

Percebendo essa necessidade da inclusão digital de idosos, o Núcleo de Estudos da Terceira Idade (NETI) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) passou a oferecer cursos e oficinas que ajudam seus alunos a lidar com as novas tecnologias. A oficina de Novas Mídias Digitais, iniciada em abril, tem a proposta de ensinar os idosos a usar aplicativos como WhatsApp, Facebook, Instagram, YouTube, Spotify e Uber. Outra iniciativa realizada pelo Núcleo é o IntegraNETI, um blog feito coletivamente pelos idosos e que tem como intuito levar conhecimento e contribuir com um novo olhar para o processo de envelhecimento.

Com a ajuda dessas iniciativas, o público que não nasceu nesta geração digital vai se adaptando. “A queixa deles é realmente comunicar, o nível mais básico da coisa. Não é mais um luxo, é uma necessidade”, conclui Luciano.
O novo idoso

O Novo Idoso

Estar conectado é uma necessidade que surgiu como parte de uma pressão social, que vê o idoso como ultrapassado, fora das tendências do mundo moderno. “Uma vez me perguntaram: ‘Jacira, tu não tens Facebook?’ E eu respondi: ‘não tenho’. E me indagaram de volta: ‘como assim tu não tens? Todo mundo tem’. Naquela hora eu me senti muito diminuída, excluída. Hoje se tu não estás no mundo digital, tu não vives ou vives com muitas dificuldades”, relata a aluna do NETI, Maria Jacira Moura, de 67 anos.

Segundo dados do IBGE divulgados em 2018, a expectativa de vida do brasileiro é de 76 anos, sendo até maior em alguns estados, como é o caso de Santa Catarina, com a expectativa de vida de 79.4 anos. “Ao atingir 60 anos, a pessoa vai viver mais um terço do que ela viveu até aquele momento, de acordo com a expectativa de vida. E 20 anos é muita coisa”, comenta o mestrando em Mídias do Conhecimento na UFSC, José Roberto Cordeiro.

Cordeiro também ressalta a importância do idoso utilizar a internet à medida que esta se torna cada vez mais imprescindível na vida da sociedade. “Hoje em dia se você quer se comunicar com alguém, comprar alguma coisa, você recorre à internet. Até porque a sociedade impõe isso, tem serviços bancários e de telefonia que são disponíveis apenas pela internet. Então imagina a pessoa hoje com 60 anos não saber fazer isso e ter que viver mais 20 anos sem saber”.

O idoso conectado imprime hoje um novo paradigma de velhice. É o que explica a gerontóloga e coordenadora do NETI, Jordelina Schier. “Hoje a gente vê que o aluno que chega aqui com 50 anos se preocupa em se inserir numa atividade diferente, traçar novos planos, e se preparar para um envelhecimento saudável. Eles vêm porque entendem que precisam manter a convivência, para manter o seu status, o seu papel social. É esse novo idoso que está vindo com força, e a internet está ajudando a construir esse idoso.”

Cursos, oficinas e palestras

O NETI fornece atividades extras durante o semestre como cursos, oficinas e palestras que envolvem o idoso no mundo digital. Essas atividades são divulgadas presencialmente no Núcleo ou via Facebook, blog IntegraNETI, site do NETI ou através do WhatsApp.
As oficinas duram em média de 4 a 8 encontros e a entrada é livre.

Onde: Av. Desembargador Vitor Lima, 145. Trindade. Florianópolis.

Contato: (48) 3721–6198.

Email: neti@contato.ufsc.br ou site, Facebook e blog.

A escola de informática Era Conectada fornece cursos pagos para auxiliar o idoso a utilizar o computador, notebook e o smartphone. O curso de smartphone é composto por seis aulas, duas vezes por semana, cada aula com 2h de duração.

Onde: R. Jeronimo Coelho 383. Centro Executivo Ildefonso Linhares, 8º Andar, Sala 802. Centro. Florianópolis.

Contato: (48) 98824–0869 (WhatsApp) — (48) 3209–7222.

E-mail: contato@melhoridadeconectada.com.br e Facebook.

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Written by Zero

Jornal-laboratório do curso de Jornalismo da UFSC

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