Paratletas de SC pressionam governo para realização dos Jogos Abertos Paradesportivos

Adiada para dezembro deste ano, a maior competição paradesportiva do estado não acontecia desde 2019, por causa da pandemia do novo coronavírus

Zero
5 min readSep 28, 2021

por Mariana Machado e Carolini Marques

Após quase um ano de distanciamento social e sem torneios esportivos, 2021 chegou para dar esperança aos paratletas que desejavam retornar às competições. Em 2020, os Jogos Abertos Paradesportivos de Santa Catarina (Parajasc), o maior e mais esperado torneio no estado, foram cancelados, o que deixou muitos atletas sem apoio e sem patrocínio. Esse é o caso de Jucelio Torquato, paratleta de Tênis em Cadeira de Rodas (TCR), que ficou sem clube para treinar durante a pandemia.

Inicialmente, os Jogos Abertos Paradesportivos de 2021 iriam ocorrer no final do mês de setembro, entre os dias 24 a 29, em Rio do Sul, porém o município catarinense enviou um ofício desistindo de sediar o torneio. Após a desistência da cidade, houve um período de dúvida sobre a realização ou não da competição. Os Parajasc chegaram a ser cancelados, porém, devido à pressão dos atletas, os organizadores voltaram atrás, como conta Claudio Alves, atleta da paranatação e do vôlei sentado. “Formamos um grupo de paratletas bem fortes nas redes sociais por toda Santa Catarina e começamos a publicar e marcar o governador e a Fesporte, porque é responsabilidade deles. É uma falta de respeito com os paratletas. Imagina, o Parajasc é o nosso campeonato estadual, ele é feito só uma vez por ano. E, para nós, eles não tiveram a competência de realizar essa competição”, conta.

No dia 17 de setembro, a Fundação Catarinense de Esporte (Fesporte) informou que a competição ocorrerá entre os dias 7 a 12 de dezembro de forma descentralizada. “Alguns municípios participantes serão sedes de modalidades específicas e enviarão à Fesporte documento oficializando essa condição”, declarou a instituição. Para Claudio, foi um sinal de que os esforços deram certo. “Acabei de receber a notícia dos Parajasc e eu estou feliz da vida. O paratleta já é uma pessoa que tem uma deficiência, já anda com várias dores, da doença, da amputação. Mas a gente treina forte todos os dias. Quando eles cancelaram, bateu um desânimo, mas tive que continuar treinando mais tranquilo”, disse.

Claudio Alves começou a treinar há menos de dois anos e precisa dos Parajasc para angariar mais patrocínios Foto: Reprodução/Instagram Claudio Alves.

Neste ano, é previsto que 508 atletas com deficiências física, visual ou intelectuais de 50 cidades do estado participem da competição catarinense. A realização do evento significa, para muitos, a oportunidade de continuar treinando e conseguir apoio de patrocinadores. “Seria muito ruim para mim se os Parajasc não ocorressem, já que quem for para o pódio ganha Bolsa Atleta”, conta o tenista Jucelio Torquato.

Atletas de alta performance que são contemplados pelos governos municipais e estaduais com a Bolsa Atleta podem receber valores que variam de R$2.500,00 a R$3.000,00. Porém, são necessários muitos pré-requisitos, sendo que a disponibilidade dos recursos varia de acordo com a portaria estabelecida para cada cidade, o que pode não atender às necessidades de todos. “É fundamental a tranquilidade proporcionada pelo Bolsa Atleta, pois, neste momento de dificuldade, sem competição, acabamos sobrevivendo do valor que é pago para alimentação da família, enfim, das despesas gerais”, enfatizou o itajaiense Flavio Reitz, paratleta do salto em altura, que participou das Paralimpíadas Rio 2016 e Tóquio 2020, em entrevista à Fesporte.

O paranadador Claudio Alves tem a meta de viver apenas do esporte. Hoje, ele precisa de patrocínio para se manter e arcar com os gastos em equipamentos e transporte — um dos gastos mais expressivos, já que precisa se deslocar 30 km todos os dias. Mas o blumenauense que entrou no mundo esportivo há menos de dois anos já está com uma boa quantidade de patrocínios. “Hoje, eu treino em duas piscinas diferentes, as melhores de Blumenau, não pago nada. Na academia também, almoço todo dia no restaurante de um patrocinador e já tem alguns empresários que estão me ajudando financeiramente. Já deu tudo certo, mas continuo correndo atrás, porque tudo que é bom pode ficar melhor”, completa.

Parajasc e inclusão

Os Jogos Abertos Paradesportivos de Santa Catarina, foram criados em 2005, visando a inclusão, desenvolvimento e integração das pessoas com deficiência (PcD) à sociedade por meio do esporte. Entre as modalidades esportivas disputadas na competição estão: atletismo, natação, tênis de mesa, xadrez, futsal, ciclismo, goalball, handebol em cadeira de rodas, natação, basquete para cadeirantes e bocha paralímpica. O estado catarinense foi pioneiro na promoção e realização de eventos poliesportivos adaptados no país, destinado aos atletas com deficiência auditiva , física , visual e intelectual .

Segundo Rosemeri Rocha, pedagoga e especialista em educação infantil e inclusão, é recente a inserção do esporte na vida das pessoas com deficiência. No ano de 1920, as modalidades esportivas começaram a ser adaptadas. Mas um dos maiores desafios enfrentados na inclusão, para Rosemeri, não é o esporte em si, mas o ambiente escolar, já que alguns familiares têm medo que as crianças com deficiência atrapalhem o desenvolvimento dos colegas. A pedagoga ressalta que é preciso chamar atenção das famílias de todos os alunos, para que participem de palestras sobre a inclusão, o desenvolvimento infantil e a aprendizagem. “Faz parte desse processo de inclusão, a empatia, a consciência sócio emocional e a amabilidade”, explica.

A prática de esportes melhora, no dia a dia, a respiração, a agilidade, a coordenação motora, o equilíbrio e em outros aspectos físicos e emocionais. Um estudo da Universidade Federal de Goiás (UFG), realizado pelas pesquisadoras e psicólogas Mariana Corrêa de Resende, Maria Nivalda de Carvalho-Freitas e Andréa Carmen Guimarães, identificou que os motivos que levaram as pessoas com deficiência a procurar o esporte adaptado foram a superação dos limites e a vontade de praticar atividades físicas. A saúde, a reabilitação e o desejo de competir foram responsáveis por manter os atletas praticando. “Também foi verificado que a prática do paradesporto auxilia no estabelecimento de relações sociais, possibilitando maior inclusão”, aponta a pesquisa.

A pedagoga Rosemeri acredita que nada pode ser considerado um impedimento para a prática do esporte, “e as Paralimpíadas estão aí para mostrar que tudo é possível. Já os Jogos proporcionam o aumento da autoestima e a socialização, valorizam a aprendizagem e possibilitam fazer parte de algo, o chamado pertencimento”. O ato de praticar esportes também pode ajudar nos quadros depressivos, de acordo com dados da Universidade de Brasília (UnB), e para Rosemeri também, já que, segundo ela, a maioria das crianças, jovens, adultos e idosos que têm algum tipo de deficiência é propensa à depressão.

No Brasil, o processo de inclusão das crianças com deficiência ainda está em desenvolvimento, mas os resultados já são visíveis, declara a pedagoga. Reforçando a necessidade da preparação dos profissionais que atuam na área da educação, Rosemeri aponta que eles “precisam ser preparados para buscar e compreender que todos podem vencer suas dificuldades e aprenderem juntos”.

Atualmente, não existe uma lei efetiva que garanta a inclusão de pessoas com deficiência praticantes de atividades esportivas no Brasil. O que existe e beneficia o esporte paralímpico é a Lei Brasileira da Inclusão da Pessoa com Deficiência — LBI (13.146/2015). Conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, a lei entrou em vigor no dia 03 de janeiro de 2016, após cumprir um período chamado vacância (período destinado à assimilação do conteúdo da nova lei). É um conjunto de normas destinadas a assegurar e promover, em igualdade de condições, o exercício dos direitos e liberdades fundamentais por pessoas com deficiência, visando à sua inclusão social e à cidadania.

--

--

Zero
Zero

Written by Zero

Jornal-laboratório do curso de Jornalismo da UFSC

No responses yet