#ZeroEmPandemia: Índia

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6 min readFeb 7, 2022

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Segundo o ministro da Saúde da Índia, Mansukh Mandaviya, 75% da população adulta do país está vacinada com duas doses contra a Covid-19, contudo há informações conflitantes sobre o número de vacinados e de mortes na pandemia do vírus Sars-Cov-2

Sumit Chauhan tem 28 anos, é professor de Yoga e mora em Mumbai, a capital financeira e cidade mais populosa da Índia — com cerca de 20 milhões de cidadãos. Ele fala que a metrópole é um exemplo de vida apressada no país e que o local está sempre muito lotado, por constantemente receber pessoas de todo o mundo. Por conta disso, em meio à pandemia da Covid-19, “às vezes desce, às vezes sobe [o número de casos de Covid]. Recentemente estão aumentando muito porque as pessoas estão indo para fora [viajando]”, afirma.

A Índia é o segundo país mais populoso do mundo, com 1,3 bilhões de habitantes. Destes, atualmente 701 milhões de indivíduos estão totalmente vacinados. Isso corresponde a 50,8% da população. Esses dados são atualizados diariamente e disponibilizados pelo Our World In Data, um laboratório de dados da Universidade de Oxford, na Inglaterra.

O indiano relembra a adaptação à quarentena: “Não podia sair para lugar algum. Foi um regime muito rigoroso. Lentamente, tornou-se um hábito para as pessoas daqui viver apenas em casa. Ninguém estava indo para fora e foi muito difícil”. Segundo o professor de Yoga, o isolamento perdurou por 18 meses, com ciclos de três meses em lockdown e três meses com flexibilização da quarentena. Sumit relatou que uma vez tentou sair de casa para ir à farmácia e foi abordado por policiais.

Atualmente, um dos meios utilizados para evitar a propagação do vírus e aglomerações é um toque de recolher noturno, das 23 h às 6 h. Durante esse horário não é permitido andar em grupos de mais de cinco indivíduos. Ambientes como shoppings e mercados estão abertos, mas com capacidade reduzida para 50% das pessoas. Mas Sumit explica que “você só pode acessar esses lugares se estiver vacinado e com a verificação da certificação de vacina”

Sumit optou por não se vacinar, então não pode frequentar espaços como centros comerciais, restaurantes, academias, entre outros. Ele continua, porém, a dar aulas presenciais de Yoga. Contrariando orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS), de médicos e cientistas, ele explica o motivo de sua escolha: “se for realmente necessário [vacinar], então eu vou aceitar. Como eu não vejo nenhum benefício e não vejo a vacinação como recomendação, decidi não me vacinar”.

Sumit em suas práticas de Yoga em casa. Imagem: Acervo pessoal de Sumit.

Para imunizar a população, o país utiliza a vacina AstraZeneca, produzida localmente pelo Instituto Sérum, e a Covaxin, fabricada pela empresa indiana Bharat Biotech. A última empresa recebeu permissão do governo em meados de 2022 para realizar testes no estágio final da dose de reforço contra a Covid-19. Essa vacina que está em testes é nasal e deve ser aplicada após o intervalo de seis meses da segunda dose.

Subnotificação de casos

Os dados mais divulgados sobre a quantidade de mortes em decorrência do novo coronavírus na Índia indicam o número de aproximadamente 500 mil pessoas. Mas estudos do Center for Global Development (CGD, ou Centro para o Desenvolvimento Global), indicam que o número pode ser até dez vezes maior, contabilizando cerca de quatro milhões de óbitos — 700% além dos números oficiais. O CGD é uma instituição dedicada a produzir conhecimento sem fins lucrativos, com sede em Washington, nos Estados Unidos.

A estimativa foi feita por meio da análise de excesso de mortalidade, comparando a quantidade de mortes registradas a mais em relação à pré-pandemia, no ano de 2019. Pesquisadores do Centro para o Desenvolvimento Global utilizaram métodos matemáticos para se aproximarem do número real de mortes, conforme o aumento dos registros em hospitais, cemitérios e outros locais.

Ainda alegaram, durante a pesquisa, que “independentemente da fonte e estimativa, as mortes reais durante a pandemia de Covid-19 provavelmente foram da ordem de magnitude maior do que a contagem oficial. É provável que as verdadeiras mortes sejam de vários milhões, não centenas de milhares, tornando esta indiscutivelmente a pior tragédia humana da Índia desde a partição e independência”.

Colapso do sistema de saúde indiano

Em março de 2021, o governo indiano declarou que o país teria vencido a pandemia, enquanto exportava a vacina para outros países e a média de casos diários se mostrava muito baixa comparada a meses anteriores. Poucas semanas depois, em maio de 2021, a situação se inverteu, com a Índia vivendo um de seus piores momentos da pandemia. Os índices de infecção por Covid-19 chegaram a quase 400 mil por dia, com cerca de 4 mil mortes diárias. Pessoas morriam nas ruas devido à falta de recursos no sistema de saúde do país, como remédios, oxigênio e leitos de UTI em hospitais — situação semelhante a vivida no Brasil. Com o alto número de mortes, não havia mais espaço para os corpos, que chegaram a ser empilhados.

Esse número exorbitante de casos de infecção pelo novo coronavírus se deu por conta do desrespeito às medidas de proteção individual, como o uso de máscaras e o distanciamento social. Naquele momento havia comemorações religiosas, reuniões políticas e partidas de jogos como críquete reunindo milhares de indivíduos.

Para tentar conter as infecções e mortalidades por Covid-19, em junho do ano passado, Narendra Modi, o primeiro-ministro da Índia, anunciou a distribuição de vacinas gratuitamente para toda a população do país, por meio de um programa do governo federal. Antes da iniciativa, o país tinha 5% da população adulta vacinada, uma diferença de 70% em relação aos dados oficiais do governo registrados atualmente.

Desigualdades sociais

Após 18 meses de suspensão do ensino presencial por conta Covid-19, em setembro de 2021 milhares de alunos retornaram às aulas no país. Durante os estudos remotos, crianças com dificuldades socioeconômicas enfrentaram problemas em acompanhar as aulas, por falta de equipamentos eletrônicos adequados, conexão de internet e ambiente preparado para o estudo.

Segundo dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), foram fechadas 1,5 milhão de escolas no país durante a pandemia, afetando aproximadamente 247 milhões de crianças. As medidas foram adotadas para evitar o contágio dos alunos em sala de aula.

Ainda há insegurança sobre como estarão as aulas nos próximos meses. Com a explosão de casos de infecção pela variante Ômicron no país, que é altamente transmissível, alguns estados da Índia optaram por paralisar as aulas presenciais em parte de janeiro.

Preparados para o futuro?

O jovem professor de Yoga relembra o início da pandemia, em março de 2020, momento em que grande parte das pessoas não tinha dimensão do risco que a Covid-19 trazia e qual seria o futuro. “Era algo muito novo, não parecia ser sério. Era como ‘ok, vamos superar isso logo’. Então não se passou apenas um mês, foram dois, três e estávamos como antes e até pior, era muito sério. Havia pessoas morrendo em todos os lugares.”

Com as vacinas contra a Covid-19, o número de mortes e casos graves tiveram grande diminuição. Um estudo divulgado na última semana de janeiro de 2022, pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças nos Estados Unidos (CDC), indica que os imunizantes e doses de reforço contra o novo coronavírus permanecem sendo eficazes contra sintomas graves e a variante Ômicron.

A OMS publicou em 2 de fevereiro deste ano uma pesquisa declarando que a variante ômicron do Sars-Cov-2 é a responsável por aproximadamente 94% dos novos casos registrados atualmente em todo o mundo. Sumit imagina que, no futuro, se algo como a pandemia provocado pelo novo coronavírus vier a acontecer novamente, há grande chance de as pessoas estarem mais preparadas para isso e cientes do que fazer.

Reportagem por Marcela Catelan, com orientação dos professores Valentina Nunes e Ildo Golfetto.

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Jornal-laboratório do curso de Jornalismo da UFSC

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